O
Museu Nacional de Arqueologia (MNA) possui um acervo de muitos
milhares, na verdade centenas de milhares, de objetos. Provêm eles de
intervenções arqueológicas programadas ou de achados fortuitos, tendo
sido incorporados por iniciativa do próprio Museu ou por depósito ou por
doação de investigadores e colecionadores.
Todos
os períodos cronológicos e culturais, e também todos os tipos de peças,
desde a mais remota Pré-História até épocas recentes, neste caso com
relevo para as peças etnográficas, estão representados no MNA. Às
coleções portuguesas acrescentam-se as estrangeiras, igualmente de
períodos e regiões muito diversificadas.
O MNA é ainda o museu português que possui no seu acervo a maior quantidade de peças classificadas como “tesouros nacionais”.
Existe,
pois, sempre motivo de descoberta nas coleções do Museu Nacional de
Arqueologia e é esse o sentido da evocação que fazemos, em cada mês que
passa.
PEÇA DO MÊS COMENTADA
O TOURO DE CINCO REIS 8
Apresentado por Ana Margarida Arruda
17 de Janeiro de 2015, às 15h
O
touro de Cinco Reis 8 é proveniente de uma necrópole escavada na área
de Beja, no contexto das intervenções de minimização de impactes sobre o
património, promovidas pela EDIA (Empresa de Desenvolvimento e
Infra-estruturas do Alqueva) no âmbito do sistema global de rega.
A
necrópole, escavada por Rosa Salvador Mateos e José António Pereira da
empresa NOVAARQUEOLOGIA (a quem agradeço, desde já, toda a colaboração),
é da Idade do Ferro, sendo datada do século VII-VI a.n.e. Insere-se
numa vasta rede de espaços funerários com características particulares e
individualizantes no quadro da Idade do Ferro do sudoeste peninsular.
Trata-se
de uma peça cerâmica, moldada à mão, que representa um bovino,
ajoelhado, de cabeça frontal e focinho de grande dimensão. A boca está
entreaberta e a cauda, destacada do corpo, enrola-se, rematando sobre o dorso com incisões que desenham um semicírculo.
O
touro da necrópole de Cinco Reis 8 remete inevitavelmente para um
universo religiosos e/ou ritual, situação que não advém exclusivamente
do contexto em que foi recuperado. Com efeito, os touros, presentes, de
forma muito expressiva, na iconografia da Idade do Ferro peninsular (bem
como aliás na de toda bacia do Mediterrâneo e no próximo oriente),
representam não só prosperidade doméstica e riqueza agrícola, mas também
têm um profundo significado religioso, podendo ser conectados com
divindades, concretamente com Baal. Porém, é difícil reconhecer em todas
as representações de touros imagens de culto, fazendo mais sentido, em
algumas circunstâncias, relacioná-las com atividades de tipo
sacrificial.
O
touro de Cinco Reis 8 apresenta características que o diferenciam da
maioria dos seus congéneres metálicos, interpretados como tampas de thimiateria,
como, no atual território português, são os casos de Mourão e Safara,
por exemplo. Enquanto estes se encontram em posição de absoluto repouso,
em atitude pacífica, deitados sobre as patas, cabeça inclinada
lateralmente, com a boca aberta e a língua pendente, o da necrópole
alentejana apresenta-se de joelhos, de cabeça para a frente, não
evidenciando a mansidão dos anteriores. Por outro lado é
consideravelmente musculado e o morrilho é muito pronunciado. A
interpretação iconológica deve, portanto, ser distinta, uma vez que a
diversidade de matéria-prima não pode ser responsável pela variedade de
atitudes. Ambas as posições são conhecidas no Oriente, onde existem quer
bovídeos reclinados (muito menos numerosos), quer a que se reconhece no
de Cinco Reis 8 (em número muito mais significativo), podendo, também
aí, ser lidos de forma diferenciada no que se refere ao significado.
Museu Nacional de Arqueologia. Entrada Livre
Sem comentários:
Enviar um comentário