19/11/2013

Peça do mês de Novembro


O Museu Nacional de Arqueologia (MNA) possui um acervo de muitos milhares, na verdade centenas de milhares, de objectos. Provêm eles de intervenções arqueológicas programadas ou de achados fortuitos, tendo sido incorporados por iniciativa do próprio Museu ou por depósito ou por doação de investigadores e coleccionadores.
Todos os períodos cronológicos e culturais, e também todos os tipos de peças, desde a mais remota Pré-História até épocas recentes, neste caso com relevo para as peças etnográficas, estão representados no MNA. Às colecções portuguesas acrescentam-se as estrangeiras, igualmente de períodos e regiões muito diversificadas.
O MNA é ainda o museu português que possui no seu acervo a maior quantidade de peças classificadas como “tesouros nacionais”.
Existe, pois, sempre motivo de descoberta nas colecções do Museu Nacional de Arqueologia e é esse o sentido da evocação que fazemos, em cada mês que passa, e renovadamente no ano de 2013, em que o MNA celebra o seu 120º aniversário de fundação.

A peça do mês

Serpente solarizada, nº inv. E 191 (cat. 73) – Egipto antigo


A apresentar por José Sales, em 23 de Novembro  de 2013 às 15h




As representações serpentiformes e os cultos ofiolátricos são fenómenos frequentes nas terras onde se desenvolveram as civilizações do Médio Oriente antigo. Como animal que se esconde na terra e que muda de pele, é habitual a serpente ser associada nessas civilizações à actividade agrária, à fertilidade, à regeneração e à imortalidade, assumindo um lugar de relevo nas suas crenças, mitos, práticas de magia e encantamentos.
No Egipto antigo, onde se distinguiam 37 tipos de serpentes, a serpente (hefau) não era mais do que a materialização da incarnação de um poder sobre-humano com força destruidora, sendo também símbolo de uma ideia de poder, imortal, do mal. A serpente era, por isso, um signo polivalente que se socorria de uma linguagem simbólica, mais ou menos complexa, para exprimir as suas várias facetas.
Uma das vertentes mais exploradas no âmbito da mitologia egípcia explora a sua relação com o Sol, sendo a mordedura do animal associada à queimadura solar. Resultado de esta associação produzida pela cosmovisão egípcia, a serpente é um ornamento profiláctico ao serviço dos deuses, do faraó e das próprias construções arquitectónicas. A serpente é mesmo o animal mais representado na antiga arte egípcia.
São numerosos os exemplos de divindades-serpente que se podem encontrar na mitologia egípcia, zoomorfas ou bimórficas (corpo humano com cabeça animal ou mesmo corpo animal com cabeça humana): Uadjit, Meretseger, Renenutet, Hetepes-Sekhus, Upset, Apopis, Neheb-Kau, Agathodaimon, as deusas com cabeça de serpente da Ogdóade hermopolitana (Nunet, Hehet, Kuket e Amonet), etc.
A serpente «em posição de alerta» (em egípcio iaret; em latim uraeus), excitada, pronta a desferir o seu ataque, com ou sem disco solar, constitui um motivo iconográfico-artístico com inúmeras utilizações e representações, praticamente desde o início da história egípcia até ao período romano.
O Além egípcio, tal como nos é apresentado pelas decorações dos túmulos do Vale dos Reis, estava repleto de serpentes, algumas gigantescas, com braços, pernas, cabeças humanas, asas, cuspindo «fogo».
A uraeus solarizada do MNA, de pescoço tumefacto, em madeira pintada, com 16 cm de altura por 4,3 cm de largura, datada dos séculos XI-VIII a.C.  (III Período Intermediário), apresenta as suas cores já muito esbatidas. No entanto, a simbologia das cores e dos materiais constitui também um elemento de destaque no âmbito da dimensão simbólica que este animal-signo apresentava no antigo Egipto. Esta vertente é particularmente importante na joalharia e nos relevos pintados.

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